segunda-feira, 2 de agosto de 2010

ACORDA, RIQUE, NO DIA DOS PAIS

Como definir a alegria e a felicidade de ser pai? Se eu fosse poeta de ofício, buscaria palavras que ouço e pronuncio todos os dias, mas que jamais saberia escrevê-las de modo simples e elegante. Se eu fosse poeta, traduziria em verso a mesma velha história que todos conhecemos, mas com texto diferente e ritmo acelerado. Como nunca serei um poeta, comparo a alegria e a felicidade de ser pai - talvez e tão somente - com o sorriso orgulhoso e a cara abestalhada de ser avô.

Movido por todos esses sentimentos, principalmente pelo “abestalhado” senso crítico, é que me revolto com a cobertura jornalística que os principais veículos de comunicação do país estão dando para dois delitos: o assassinato de Mércia Nakashima e o caso Bruno (com o desaparecimento ou morte de Elisa Samudio), sem ao menos citarem o maior e mais cruel crime praticado no Brasil nos últimos anos.

A desproporção é gigantesca. Raramente lemos ou vemos uma nota no canto da página de jornais ou revistas sobre um atentado absurdo contra a vida de um jovem – ocorrido no coração da maior cidade do País - na Avenida Paulista, na Cidade de São Paulo. Nunca mais foi feita uma reportagem na televisão sobre a ignorante agressão que transformou em pesadelo a vida de uma família. Os sites noticiosos simplesmente se esqueceram deste caso tenebroso.

Ainda não passaram os 356 dias necessários? É que a imprensa, em geral, adora fazer reportagens em datas redondas, quando se completa um ano ou mais disso ou daquilo. Talvez seja o caso. Só assim essa pergunta seria respondida. Um organizado pauteiro lembraria a sua direção de jornalismo sobre a data exata de um ano do dia em que se perpetrou uma história escabrosa. Um imbecil personal trainer chamado Alessandrer Fernando Aleixo, 38 anos, entrou na livraria Cultura, do Conjunto Nacional, na Avenida Paulista, armado com um taco de beisebol, com o qual atingiu a cabeça do designer Henrique de Carvalho Pereira, 22 anos.

O parvo personal não tinha motivo para a agressão. O energúmeno entrou na livraria e mirou com o porrete a cabeça de Rique (assim Henrique é chamado pela família) com a mesma simplicidade com que falamos bom dia, boa tarde ou boa noite.

Rique está em coma há sete meses e o pusilânime do Aleixo está preso, aguardando julgamento.

Se eu fosse um poeta romântico, exigira para Aleixo o público linchamento.

Se eu fosse um poeta simbolista faria versos nos quais a dupla culinária Coxinha e Macarrão - denunciados como possíveis assassinos de Elisa Samudio - praticaria o exercício do esquartejamento, com direito, em seguida, a um pijama de concreto.

Se eu fosse um Drummond ou Vinícius imaginaria o ex-policial Mizael Bispo de Souza - indiciado pela morte de Mércia Nakashima - jogando o carro de Aleixo numa represa, negando-lhe até o fim a mão salvadora. Morreria afogado.

A revolta, enfim, desata os instintos que o homem esconde e doma para sobreviver no dia a dia.

O que o estulto, néscio e lerdaço do Aleixo fez com Rique mereceria destaque diário na imprensa nacional. Rique, quando agredido, estava na livraria fazendo uma pesquisa para a conclusão de seu curso de designer. Mas não se formou. Em março deste ano, mês da festa de diplomação de sua turma, ele estava em coma num leito do Hospital das Clínicas.

A manifesta imbecilidade de Aleixo subtraiu, de maneira vil e desnecessária, a alegria e a felicidade de Elifas e Silvania Pereira, pais de Rique. Talvez com sorriso orgulhoso e cara de abestalhados Elifas e Silvania vejam, sete meses depois, o renascer de Rique, mas não prematuramente, pois tempo já se faz.

Rique vai acordar. Ele merece renascer. Elifas e Silvania irão compartilhar a alegria e a felicidade de serem, novamente, os pais de um jovem ativo, promissor e talentoso. Acorda, imprensa. Acorda, Rique, no Dia dos Pais.

4 comentários:

  1. Este comentário foi removido pelo autor.

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  2. Maravilhoso texto, mais que digno chacoalho na imprensa, além de um honroso pedido de despertar!
    Pouco conhecia de seus textos, simplesmente ouvia os bons comentários sobre eles, estou cada vez mais dignificado e honrado em trabalhar com você Luchetti.
    Outro dia pesquisei sobre este lamentável evento para o Netão, para mais um "Que país é esse?", e pensando justamente na minha imensa vontade de me tornar pai me indigno com estes "valentões", "pitboys", que enrijecem seus músculos e atrofiam seus cérebros.

    Abraços,

    Renato Loeb

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  3. Ôrra, meu! Essa seção remember é ótima. Nesse Dia dos Pais vamos ser inundados de reportagens de como dar presentes e histórias de sucesso. Infelizmente vão nos fazer esquecer das famílias que foram destruídas pelas mãos de criminosos. Este tipo de caso é o pior que pode acontecer: a vida de um jovem que foi abreviada por um maníaco. Quando uma pessoa na idade adulta morre, lembramos de seus feitos. Já um jovem, pensamos em quantas coisas ele poderia ter feito. Henrique de Carvalho Pereira tem tudo para brilhar. Para o CowParade deste ano, ele confeccionou a "Vaca Sampa", usando as cores do estado de São Paulo, vermelho e preto. Muito bonita. Fico aqui na torcida. Henrique, acorda.

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  4. Após 10 meses em coma, morre jovem agredido com taco em livraria de São Paulo.
    É mesmo uma grande tragédia para a família e para a sociedade.
    Muito triste!
    Roberto

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